domingo, 31 de outubro de 2010

Uma sociologia das baladas

Não sou um Pierre Bourdieu, mas faço o melhor que posso.

Interrompendo apenas por um momento as notícias romanescas do nosso querido amigo Andreas Der Mann (rs), gostaria de relatar minhas curiosas observações sobre o evento mais celebrado da nossa geração (80 e 90's): a balada.

Antigamente, eu ouvia o termo e me lembrava das canções de antigos menestréis espanhóis ou portugueses, ou de forma menos solene, as canções românticas de artistas do nosso tempo e do tempo das nossas mães, avós... coisas como "F... Comme Femme", ou "Love me, Tender", ou ainda "Michelle".



Salvatore Adamo mostrando sua atraente e elegante voz sem sincronia com o video

Mas fiquei mais velha e descobri que balada significava outra coisa, aparentemente mais excitante, mas bem mais boba de fato.

Na última sexta-feira foi meu aniversário. Chamei dois amigos e minha irmã para irmos a uma festa de rock (segundo o que anunciavam no site da casa noturna chamada Pista 3, do monopólio carioca Grupo Matriz). Gosto de festas de boa música, você paga, não conhece ninguém, ninguém te convidou, mas isso é igual pra todos... pagou, entrou, bebeu, dançou. Democracia das festas, você não tem que disputar a atenção de algum anfitrião ou rezar para que venham à sua festa.

No ano passado, fui à Casa da Matriz, que tem um ótimo ambiente, espaçoso, toca música boa, (de rock indie-eletro-pop a Creedence Clearwater Revival), e saí 4h30. A casa tem lounge com obras de artistas jovens, fliperama,, duas pistas e cardápio de bebidas variado, incluindo uma elegante renomeação, "Espanhola, para a deliciosa bebida com nome nojento, "Pau na Coxa" (vinho e leite condensado). Ao contrário da matriz (Casa da Matriz, criativo, hein? É que a casa fica na Rua da Matriz, perto da Igreja da Matriz, em Botafogo... qualquer coisa perguntem ao Papa Ratzinger... Andreas!), a Pista 3 é um bunker como qualquer casa noturna feita para as baladas da minha geração em diante: um buraco isolado acusticamente com banheiros minúsculos, um bar para que as pessoas possam encher a cara, uma pista com música ruim (Black Eyed Peas et al) pesada, mas tudo bem para quem já bebeu o bastante, e luzes piscando no breu, onde um monte de gente se amontoa e não podemos ver a cara de quase ninguém. Foi lá que (tentei) celebrei meus 29 anos.

Depois de dois chopps e uma taça de espumante, é possível reduzir seu senso crítico a um nível de rio calmo e perene sem chuva, mas não esvaziá-lo. Você dança meio sem graça a uma música que tem uma batida 2/4 repetitiva e luzes que brilham no fundo da sua retina com uma rapidez, e tantas pessoas sem identidade à sua volta quais fantasmas. Um homem passa mal com a cara numa lixeira. Outros dançam, outros só ficam parados no meio da turba à caça de vítimas. Porque eles se dizem "caçadores". Meu pai dizia: homem tem que trair, porque é caçador. Então, o machismo de homens como meu pobre pai foi recompensado com a humilhação de caçar num aquário preto regado a Absolut. Boa sorte.

Um cara fortinho me encarava e eu sem ânimo para aquele drama tragicômico saí à francesa e fui para o segundo piso, onde havia uma mesa de sinuca. Fiquei numa fila do banheiro onde havia 5 ou 6 meninas falando pelos cotovelos de forma ridícula, bêbadas, com suas maquiagens e roupas dark e pseudo-alternativas saíam pela culatra num espaço de menos de 2 m². Quando voltei à pista, o fortinho havia avançado sobre uma amiga e aparentemente se deram bem. Ufa. Mas quando eu me cria salva, aparece outro fortinho que me tasca um : "queria te conhecer". Aff. Para minha surpresa, ele depois me apresentou ao seu "peguete" (como se diz na gíria carioca super modernosa sobre pessoas com quem se mantém um vínculo sexual momentâneo sem compromissos futuros), para me dizer de forma indireta que ele era gay, e que uma amiga dele gostou muito de mim. Puxa, eu disse, é um elogio, mas não gosto de meninas. E assim seguiu-se a noite, eu levando cantada de meninas, ou de homens bêbados, por outro lado. Não, caro(a) leitor(a), eu não peguei ninguém.

O que mais me espanta na minha geração é a imensa capacidade de eles viverem cenas repetidas e nunca se cansarem. O cara bebe, bebe, e passa mal... aí bebe de novo. A menina fica com um, fica com outro, beija, beija, e fica com mais um. Elas repetem seus padrões de vestir, suas bolsas e sapatos, suas maquiagens, algumas vezes "dark", pois elas têm estilo, não se existe, o estilo existe antes. Os meninos com as mesmas posturas de segurança na frente de supermercado ou de salva-vidas de piscina de clube. E as cantadas... meu Deus, que frases hediondas. A gente tem que rir mesmo, não é simpatia...



Não sou contra o hedonismo e o descompromisso, eventualmente. Mas ser livre não é o mesmo que ser vulgar e repetitivo. Minha geração em diante... sofre-se um mal que é o mal do desamor, do desacato, do desrespeito, da desconsideração, do desleixo. É basicamente uma DesGeração. Todo um vazio, uma bocarra de Moby Dick à nossa espera, e os ignaros e tolos nunca pareceram piores. Nossos inimigos começam em nossos espelhos, ao contrário da geração de nossos pais e avós, cujos inimigos eram o Capitalismo, o Conservadorismo, o sistema, o governo, as leis racistas, a segregação, a brutalidade. De fato estes ainda são nossos inimigos, mas minha geração prefere ir à balada (não a dos cantores ultra-românticos de antigamente) para beber e cair, e assim, no breu e no desperdício de energia e calor, olvidar o front. Olvidar-se e lançar-se numa terra de ninguém. Nenhum futuro, nenhum passado, nenhuma piada terna, nenhuma conexão. No man's land.

Fico com a antiga balada.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

“I Gatti di Roma” ou, “Os gatos de Roma”.


Roma é uma cidade curiosa.


Nós como seres humanos, em grande parte pelo sistema de crenças judaico-cristão, tendemos a naturalmente pensar que o mundo é o nosso playground pessoal, e que tudo o que nos rodeia foi criado exclusivamente para nosso bel prazer.

Em uma cidade como Roma, está escancarada em faces de rochas nuas a questão da transitoriedade e relativismo de tudo o que nos rodeia. Ao escavarmos uma rua, temos um verdadeiro mapa da história e psique humana. Lembranças recentes da Roma enquanto moderna metrópole representada em algum maço de cigarros jogado em um canto qualquer, se misturam com evidentes traços estratificados de períodos mais antigos: Traços Barrocos, Renascença. Bairros medievais. Caravaggio trabalhando em Roma em 1592 até 1606. A Comuna Romana em 1084. O sagrado Império Romano, em 799. Domínio Bárbaro e Bizantino em 480. A morte de Marco Aurélio em 180. Julio César invadindo Roma em 49 A.C. com sua Legião. A formação da República em 509 A.C. Domínio Etrusco em 650 A.C. Traços de fortalezas datando de 800 A.C nas margens do rio Tibre. Evidencias de movimentos migratórios Indo-Européias para a região, em 2.000 A.C. Saímos da história arqueológica para adentrar os reinos dos mitos e lendas, tentando localizar no tempo, Rômulo e Remo, os órfãos criados por uma loba que supostamente fundaram Roma em 753 A.C.

Nos acostumamos a pensar as metrópoles por nós criadas, como exclusivamente nossos domínios.

Apesar da história que permeia esta cidade, não são os humanos que dominam e governam-a. Seus habitantes mais dignos são notoriamente dotados de uma realeza particular. São os gatos de Roma.

Em várias instâncias, os gatos Romanos possuem mais direitos legais do que as pessoas. Muito sensato, eles fizeram por merecer em sua história felina particular. Acaso você tenha a sorte de um gato nascer na porta da sua casa, por lei ele tem o direito legal de morar em sua propriedade – Você não tem a obrigatoriedade de cuidar dele. Mas se ele quiser se sentar em frente a TV e assistir a algum programa qualquer, deixe-o. A sua vida e a dele serão mais fáceis.

A origem destes gatos em Roma está diretamente a queda do antigo Império Egípcio. Quando este sucumbiu, seus gatos embarcaram em navios mercantes e se espalharam pelos quatro cantos do Império Romano, e após, mais além, para o mundo. Neste caso particular, foi algo bom para Roma, pois exerceram importante função no controle dos ratos, especialmente nos idos de 1300, quando a peste bubônica assolou acá estas bandas.

Infelizmente, a Igreja Católica Romana fez o favor de considerar os gatos como bruxas, e logo ordenou a caça aos gatos. Como existe uma curiosa simbiose entre Roma e seus gatos, com tal caça logo a população de ratos dominou o Império, e a peste se espalhou por todos os cantos.

Com a modernização da Igreja, os gatos logo retornaram a Roma. Mas se tornaram ineficazes como agentes controladores dos ratos pois, os mesmos tiveram coisa de 7 séculos para crescer e se desenvolver, período este que nós conhecemos como a era das grandes fogueiras – totalmente síncrono com o período da caça as bruxas e Santa Inquisição.

No último censo do departamento de direitos dos animais da comuna de Roma - Ufficio dei diritti degli animali – a estimativa é de que a população felina Romana gira em torno de 300.000 a 500.000 gatos errantes pelas ruas, praças, monumentos, cemitérios, hospitais e institutos religiosos Romanos. Geralmente escolhem estes lugares como habitat pois ali recebem alimentos, abrigo e proteção. É interessante perceber que todos os sítios arqueológicos, contam com uma espécie de comunidade local felina. São tranquilos, na deles. Costumam ficar espalhados, sentados, em cima de antigas colunas de ruínas antiquíssimas.. Escondidos em catacumbas.. Ou vigiando os cemitérios e templos. As vezes, vê-se gatos correndo atrás de ônibus.. Ou pendurados em janelas de prédios de apartamentos com suas unhas.

- O que eles pensam, enquanto olham os restos da Roma antiga? Perceberam eles, o nascer, florescer, auge e declínio do Império Romano?

A região do coliseu conta com algo entre 200 a 500 gatos, mas o verdadeiro santuário de gatos de Roma é o Largo di Torre Argentina“, um dos mais antigos templos de Roma, datando algo entre 400 a 300 A.C.

- Me pergunto se seriam tais gatos descendentes dos que ali testemunharam Julio César ser esfaqueado por seu rival Brutus, em 44 A.C.?

Em comparação ao coliseu, tal templo e suas colunas são minúsculas, por isso impressiona sua população de 300 a 400 gatos. Ali, encontraram refúgio do caos e tráfego da região central Romana. Recebem alimentação, são cuidados e tratados por um grupo internacional de voluntários, que levantam fundos organizando rifas, jantares e mercados de pulgas a céu aberto, bem como recebendo doações privadas de turistas que, não raro; parecem muito mais interessados nos gatos em si do que nas ruínas. Uma coisa legal é que qualquer um pode se voluntariar ao grupo da Torre Argentina alimentando os gatos, ou até melhor; limpando suas pequenas caixas..

Geralmente são velhas senhoras chamadas “Gattare” que cuidam destes felinos de rua. Alimentam-os todos os dias com seu próprio dinheiro. É comum vê-las ao amanhecer ou anoitecer, empurrando seus carrinhos cheios de comida para os gatos Romanos. Até mesmo restaurantes as vezes costumam colocar pratos de comida sobre bonitas toalhas de mesa e uma vela bem como uma garrafa de Chianti em becos de Roma, para os gatos. Não aceitam reservas, claro; mas os gatos se saem bem. Parece brincadeira, mas não é.

Os gatos Romanos, embora poucos sabem disso, são assunto sério.

Como é importantíssimo a vacinação e castração, os serviços veterinários públicos tratam como prioridade os cuidados a população felina Romana, e acompanham de perto a comunidade felina. E, foram além. A Comuna Romana, baseada em uma lei Italiana nacional de 1991, baniu a morte de cães e gatos de rua, e protegem-nos com o título de “patrimônio biocultural”.

É de encher os olhos, perceber e entender o quanto os gatos são tratados e a noção que aqui existe, de que os gatos pertencem a própria cultura Italiana...



segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Notícias Romanescas

Pessoal, olá!!

Lhes peço desculpas pelo blog estar um tanto jogado as moscas por hora.

Mas, por um ótimo motivo – ao menos para mim hehehe

Ocorre que estou por uns tempos em Roma, e daqui sairei por uma tour pela Europa nos próximos meses. Mas o blog não foi abandonado de forma alguma, prepararei algumas postagens sobre minhas andanças por aí...

Roma é uma cidade fantástica, não tem absolutamente NADA a ver com qualquer ideia pré-concebida pela mídia, cartões postais & imagens que costumamos comumente ver. Apenas estando aqui para entender isso.

Em meu primeiro dia por aqui me chamou a atenção a quantidade de musicistas da boa boemia que pegam seus instrumentos – Cellos, Violinos, Violas, Contrabaixos etc – e sentam-se em frente a monumentos históricos seculares e ficam lá, tocando.. É impressionante!

Soube de uma escola de música voltada ao Cello aqui nos arredores, 3 aulas por semana de 1 hora cada, pela bagatela de 120 Euros/mês. Pode ser uma opção interessante acaso eu decida lançar âncoras de vez por aqui, em janeiro, quando encerro minhas andanças pela Europa. Um fato curioso sobre esta escola é que me avisaram o seguinte: Esqueça tentar entrar lá com instrumentos chineses ou industrializados, você sequer conseguiria fazer a inscrição.

Por outro lado tive uma grata surpresa; é possível comprar instrumentos Italianos de Luthier, nível intermediário, por 300,00 Euros.


Bom, veremos o que o futuro me reserva nesse sentido...

Forte abraço a todos!!

Andreas