quinta-feira, 28 de outubro de 2010

“I Gatti di Roma” ou, “Os gatos de Roma”.


Roma é uma cidade curiosa.


Nós como seres humanos, em grande parte pelo sistema de crenças judaico-cristão, tendemos a naturalmente pensar que o mundo é o nosso playground pessoal, e que tudo o que nos rodeia foi criado exclusivamente para nosso bel prazer.

Em uma cidade como Roma, está escancarada em faces de rochas nuas a questão da transitoriedade e relativismo de tudo o que nos rodeia. Ao escavarmos uma rua, temos um verdadeiro mapa da história e psique humana. Lembranças recentes da Roma enquanto moderna metrópole representada em algum maço de cigarros jogado em um canto qualquer, se misturam com evidentes traços estratificados de períodos mais antigos: Traços Barrocos, Renascença. Bairros medievais. Caravaggio trabalhando em Roma em 1592 até 1606. A Comuna Romana em 1084. O sagrado Império Romano, em 799. Domínio Bárbaro e Bizantino em 480. A morte de Marco Aurélio em 180. Julio César invadindo Roma em 49 A.C. com sua Legião. A formação da República em 509 A.C. Domínio Etrusco em 650 A.C. Traços de fortalezas datando de 800 A.C nas margens do rio Tibre. Evidencias de movimentos migratórios Indo-Européias para a região, em 2.000 A.C. Saímos da história arqueológica para adentrar os reinos dos mitos e lendas, tentando localizar no tempo, Rômulo e Remo, os órfãos criados por uma loba que supostamente fundaram Roma em 753 A.C.

Nos acostumamos a pensar as metrópoles por nós criadas, como exclusivamente nossos domínios.

Apesar da história que permeia esta cidade, não são os humanos que dominam e governam-a. Seus habitantes mais dignos são notoriamente dotados de uma realeza particular. São os gatos de Roma.

Em várias instâncias, os gatos Romanos possuem mais direitos legais do que as pessoas. Muito sensato, eles fizeram por merecer em sua história felina particular. Acaso você tenha a sorte de um gato nascer na porta da sua casa, por lei ele tem o direito legal de morar em sua propriedade – Você não tem a obrigatoriedade de cuidar dele. Mas se ele quiser se sentar em frente a TV e assistir a algum programa qualquer, deixe-o. A sua vida e a dele serão mais fáceis.

A origem destes gatos em Roma está diretamente a queda do antigo Império Egípcio. Quando este sucumbiu, seus gatos embarcaram em navios mercantes e se espalharam pelos quatro cantos do Império Romano, e após, mais além, para o mundo. Neste caso particular, foi algo bom para Roma, pois exerceram importante função no controle dos ratos, especialmente nos idos de 1300, quando a peste bubônica assolou acá estas bandas.

Infelizmente, a Igreja Católica Romana fez o favor de considerar os gatos como bruxas, e logo ordenou a caça aos gatos. Como existe uma curiosa simbiose entre Roma e seus gatos, com tal caça logo a população de ratos dominou o Império, e a peste se espalhou por todos os cantos.

Com a modernização da Igreja, os gatos logo retornaram a Roma. Mas se tornaram ineficazes como agentes controladores dos ratos pois, os mesmos tiveram coisa de 7 séculos para crescer e se desenvolver, período este que nós conhecemos como a era das grandes fogueiras – totalmente síncrono com o período da caça as bruxas e Santa Inquisição.

No último censo do departamento de direitos dos animais da comuna de Roma - Ufficio dei diritti degli animali – a estimativa é de que a população felina Romana gira em torno de 300.000 a 500.000 gatos errantes pelas ruas, praças, monumentos, cemitérios, hospitais e institutos religiosos Romanos. Geralmente escolhem estes lugares como habitat pois ali recebem alimentos, abrigo e proteção. É interessante perceber que todos os sítios arqueológicos, contam com uma espécie de comunidade local felina. São tranquilos, na deles. Costumam ficar espalhados, sentados, em cima de antigas colunas de ruínas antiquíssimas.. Escondidos em catacumbas.. Ou vigiando os cemitérios e templos. As vezes, vê-se gatos correndo atrás de ônibus.. Ou pendurados em janelas de prédios de apartamentos com suas unhas.

- O que eles pensam, enquanto olham os restos da Roma antiga? Perceberam eles, o nascer, florescer, auge e declínio do Império Romano?

A região do coliseu conta com algo entre 200 a 500 gatos, mas o verdadeiro santuário de gatos de Roma é o Largo di Torre Argentina“, um dos mais antigos templos de Roma, datando algo entre 400 a 300 A.C.

- Me pergunto se seriam tais gatos descendentes dos que ali testemunharam Julio César ser esfaqueado por seu rival Brutus, em 44 A.C.?

Em comparação ao coliseu, tal templo e suas colunas são minúsculas, por isso impressiona sua população de 300 a 400 gatos. Ali, encontraram refúgio do caos e tráfego da região central Romana. Recebem alimentação, são cuidados e tratados por um grupo internacional de voluntários, que levantam fundos organizando rifas, jantares e mercados de pulgas a céu aberto, bem como recebendo doações privadas de turistas que, não raro; parecem muito mais interessados nos gatos em si do que nas ruínas. Uma coisa legal é que qualquer um pode se voluntariar ao grupo da Torre Argentina alimentando os gatos, ou até melhor; limpando suas pequenas caixas..

Geralmente são velhas senhoras chamadas “Gattare” que cuidam destes felinos de rua. Alimentam-os todos os dias com seu próprio dinheiro. É comum vê-las ao amanhecer ou anoitecer, empurrando seus carrinhos cheios de comida para os gatos Romanos. Até mesmo restaurantes as vezes costumam colocar pratos de comida sobre bonitas toalhas de mesa e uma vela bem como uma garrafa de Chianti em becos de Roma, para os gatos. Não aceitam reservas, claro; mas os gatos se saem bem. Parece brincadeira, mas não é.

Os gatos Romanos, embora poucos sabem disso, são assunto sério.

Como é importantíssimo a vacinação e castração, os serviços veterinários públicos tratam como prioridade os cuidados a população felina Romana, e acompanham de perto a comunidade felina. E, foram além. A Comuna Romana, baseada em uma lei Italiana nacional de 1991, baniu a morte de cães e gatos de rua, e protegem-nos com o título de “patrimônio biocultural”.

É de encher os olhos, perceber e entender o quanto os gatos são tratados e a noção que aqui existe, de que os gatos pertencem a própria cultura Italiana...



13 comentários:

Tami l'etrange disse...

É incrível como uma cultura sempre acabará influenciando a outra... Os gatos eram venerados como seres divinos, os animais favoritos dos Deuses e muito da cultura grega é baseada na egípcia. Conseqüentemente, com a queda da Grécia e sua conquista por parte de Roma, eles acabaram tomando como base a cultura deles. Sabia que no antigo Egito existia (e até hoje eles ainda estão lá, só que praticamente extintos pelos árabes) uma raça chamada Mau Egípcio, e que os arqueólogos dataram como a raça mais antiga em todo o globo, pois mesmo antes da era em que o alto Egito estava em seus primórdios (Era de Amon), esses gatos eram venerados e quando morriam, eram mumificados? Isso dá muito mais de 6000 mil anos! Legal, né?

Beijos

Leoneяd disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Leoneяd disse...

lol, não sou nenhum fã d gatos mas d certo modo os admiro, não dá pra defender meu cachorro no quesito inteligencia...
bom post, e sobre vociferar contra o vaticano...wee *-*, sou metaleiro e agnóstico, grande fã de religiões pagãs como o Asatrú e Wiccanismo, vai fundo, esculacha!

Leoneяd disse...

pls, entra la no meu blog e deixa um comment *-*

Cecil disse...

Querido Andreas,

obrigada por este post. Como uma elurófila que você sabe que sou, fiquei encantada. Roma é uma cidade para mim.

Nem vou falar mais nada, somente citar Mark Twain:
"De todas as criaturas de Deus, somente uma não pode ser castigada. Essa é o gato. Se fosse possível cruzar o homem com o gato, melhoraria o homem, mas pioraria o gato."

Um beijo.

Cecil disse...

PS.: mas a parte da garrafa de Chianti me fez rir.. gatos não bebem. Aliás, há coisas que as pessoas até dão para os cachorros, mas que para os gatos pode ser tóxico, como chocolate. Não sei o que aconteceria com um gato que bebesse vinho, mas melhor não arriscar.

Anônimo disse...

Cecil querida,
Provavelmente você já deve ter visto essa foto aqui em outro lugar; mas se não, te mostro com o maior prazer... :)

http://img152.imagevenue.com/img.php?image=06816_DSC05142_122_402lo.JPG

É o moderníssimo sistema de aquecimento instalado em minha cama aqui em Roma... Funciona super bem!! :) rs

Gatos.. humpff!! Embora ande com saudades de meus cães, não tem como não me divertir com esses gatos que andam reinvidicando a posse da minha casa aqui... rs

Ótima citação de Twain... :)

Ah! O Chianti acaba que não vai para os gatos... As garrafas acabam parando nas mãos de outras criaturas errantes da noite Romana, que não os gatos... rs

Anônimo disse...

Tami, Olá!!
Eu sei de algumas coisas dos gatos mumificados do Antigo Egito... Saiu uma matéria legal na National Geographic tempos atrás - a revista, não o canal. rs
O Mau Egípcio seria aquele que apresenta um padrão malhado, meio rajado, não?
A sua "divindade" era uma extenção e derivação da própria deusa Bastet e seu culto. Curioso que quando houve o início do intercâmbio cultural entre Gregos e Egípcios, Bastet foi "linkada" a Artemis, tornando-se uma deusa da lua, e não do sol. É interessantíssimo isso!
Bjs!! (E, obrigado por dividir isso com a gente!!:)

Anônimo disse...

Leonerd, e aí? Bom?

"Vociferar" contra o Vaticano não é relacionado a própria doutrina Católica, mas sim, quanto a própria instituição; a estrutura e ostentação presente no Estado do Vaticano.. É muita cara de pau, lhes explico depois nos posts seguintes...

Cuidado!! Estás pisando em terreno perigoso, adoro gatos!! hahaha
Mas, adoro igualmente cachorros... Tanto que deixei dois cachorros, companheirões meus mesmos, em minha cidade, no Brasil. Que saudade deles! rs
Mas é impossível comparar cães e gatos, ambos são muito inteligentes, mas a estruturação mental deles é completamente diferentes... rs Mas, cada um ao seu modo, tanto cães quanto gatos são inteligentíssimos, é fato!! rs
Quanto ao seu cão; cuidado, ele de fato pode ser mais inteligente do que imagina, talvez ele só se faça de desentendido.. Afinal, não existem muitas pessoas assim? rs

Ah! Adoro tudo o que se refere a mitologia e sistemas de crenças ditas "pagãs" mas não me restrinjo apenas a elas, na verdade vou beeem além... rs

Mas não, não vou esculachar pois não seria correto.. Todas as minhas críticas tem um "q" racionalizado, bem como tento embasá-las muito bem... Mas procuro respeitar sempre... (E, ainda assim, me taxavam de macumbeiro... ai ai ai, que desânimo! rs)

Ah! Considera-se fã do velho e bom heavy metal? Pois bem, lá vou eu dar uma passada em teu blog.. :)

Abração aí!!

Cecil disse...

Haha, que coisa linda... essa cama deve ficar mesmo aconchegante... mas os gatos também têm uma capacidade única de, às vezes, se posicionarem da forma mais confortável para eles, e que coloque o humano dono da cama na posição mais dolorida e ridícula pelo resto da noite, rsrs...

Ah, os cães são inteligentíssimos e doces... muito diferentes dos gatos, pois eles convencem as pessoas de que dependem delas para viver, agradando o ego humano, que ama a sensação de poder completo sobre outros seres. Os gatos já não ligam para agradar aos humanos. Eles só fazem o que querem, mas também são muito meigos. Enfim, posso ficar aqui a noite toda elevando os animais sobre os seres humanos, principalmente meus amados felinos.

Bem feito para os europeus que massacraram tantos gatos por causa da ignorância cristã... pagaram com a Peste Negra. Se era a deusa Bastet que se vingava, ela ficou saciada... 1/3 da população européia desapareceu do mapa, segundo dizem...

Leoneяd disse...

naum foi tao literal o esculachar nao tá Andreas! (rsrsrs) eh q tenho um poco d raiva pelos motivos q vc falo e pq quase extreminaram as antigas religiões e culturas, q sao mto interessantes.

Arám disse...

Andreeeeaaaaaasssssss!!! Tive que postar, depois dessa dos gatos romanos, impossível! Vou escrever um texto aqui, escrever não, "colar" um texto, que achei pertinente...

“Já viu gato amestrado, de chapeuzinho ridículo, obedecendo às ordens de um pilantra que vive às custas dele? Não!
Até o bondoso elefante veste saiote e dança a valsa no circo. O leal cachorro no fundo compreende as agruras do dono e faz a gentileza de ganhar a vida por ele. O leão e o tigre se amesquinham na jaula.
Gato não. Ele só aceita uma relação de independência e afeto. E como não cede ao homem, mesmo quando dele depende, é chamado de arrogante, egoísta, safado, espertalhão ou falso. “Falso”, porque não aceita a nossa falsidade com ele e só admite afeto com troca e respeito pela sua individualidade.
O gato não gosta de alguém porque precisa gostar para se sentir melhor. Ele gosta pelo amor que lhe é próprio, que é dele e ele o dá se quiser.
Quem não se relaciona bem com o próprio inconsciente não entende o gato. Ele aparece, então, como ameaça, porque representa essa relação precária do homem com o (próprio) mistério.
O gato não se relaciona com a aparência do homem. Ele vê além, por dentro e pelo o avesso. Relaciona-se com a essência.
Se o gesto de carinho é medroso ou substitui inaceitáveis (mas existentes) impulsos secretos de agressão, o gato sabe. E se defende do afago. A relação dele é com o que está oculto, guardado e nem nós queremos, sabemos ou podemos ver.
Por isso, quando surge nele um ato de entrega, de subida no colo ou manifestação de afeto, é algo muito verdadeiro, que não pode ser desdenhado. É um gesto de confiança que honra quem o recebe, pois significa um julgamento.
O homem não sabe ver o gato, mas o gato sabe ver o homem.
Se há desarmonia real ou latente, o gato sente. Se há solidão, ele sabe e atenua como pode (ele que enfrenta a solidão de maneira muito mais valente que nós). Se há pessoas agressivas em torno ou carregadas de maus fluidos, ele se afasta.
Lição de saúde sexual e sensualidade. Lição de envolvimento amoroso com dedicação integral de vários dias.
Lição de organização familiar e de definição de espaço próprio e território pessoal.
Lição de anatomia, equilíbrio, desempenho muscular.
Lição de salto, lição de silêncio. Lição de introversão.
Lição de contato com o mistério, com o escuro, com a sombra.
Lição de religiosidade sem ícones. Lição de alimentação e requinte.
Lição de bom gosto e senso de oportunidade.
Lição de vida, enfim, a mais completa, diária, silenciosa, educada, sem cobranças, sem veemências, sem exigências.

O gato é uma chance de interiorização e sabedoria posta pelo mistério à disposição do homem.” O GATO É UMA LIÇÃO
Artur da Távola

Sem mais palavras... Espero encontrá-los quando estiver por aí!
Bj gde!
Arám

Tami l'etrange disse...

Sim, sim! Bast - como carinhosamente a chamo é a Deusa egípcia que mais detém minha admiração. Sou perdidamente apaixonada pelo Egito antigo, qualquer coisa que me perguntar posso lhe responder. A única coisa que me entristece, é que é meio complicado se tornar egiptólogo aqui... Sim o Mau é esse mesmo. Sabia que sua imagem foi tomada como base para a criação de Bast? Pode comparar, tem os mesmo traços *Sorriso*
Disso eu não sabia!
Tinha certeza que havia uma explicação para Atenas ser minha Deusa favorita da mitologia grega. Mesmo? É uma pena, não vi essa edição aqui... Ah! E não há de quê

Beijos