Faz um tempinho já que queria resenhar este cara por aqui, mas não fazia a menor idéia do que escrever a respeito, fora que é uma das melhores coisas que ouvi nos últimos tempos.
Claro, sou suspeito para escrever algo sobre eles, visto que recentemente tive a oportunidade de ter contato com a Cellista que toca com este distinto senhor – distinto, para não dizer estranhíssimo – a Srta. Julia Kent.
E óbvio, nem preciso mencionar o quão paga pau sou dessa mulher, ex- Rasputina junto com a Zöe Keating; que a estas horas também anda desenvolvendo seu trabalho solo bem como participação em outras bandas como a própria Srta. Kent - sinto eu que tudo o que esta mulher toca vira ouro, Cellisticamente falando, claro.
Mas isto não muda o fato de que temos em Antony uma genialidade absolutamente contundente, diretamente proporcional à figura bizarra enquanto sua faceta artística ao analisarmos o tipo de trabalho que o mesmo executa.
Se não, vejamos, o que dizer de um cantor e pianista branco, que beira o transexualismo mas com pitadas de androginia pura?
Nascido na Inglaterra e criado na Califórnia, Antony Hegart, hoje com trinta e poucos anos, desenvolveu sua carreira em Nova York. Atualmente em vias de lançar seu 3º trabalho de estúdio, o aguardado “The Crying Light”, Antony merecidamente conquistou espaço de destaque entre os compositores modernos como Damien Rice, Rufus Wainwrigth e Ellioth Smith entre outros.
Antony canta como se fosse um homem com voz feminina, algo como Morrissey encarnando Nina Simone, ou Marianne Faithfull, Scott Walker e Tom York juntos, interpretando peças líricas clássicas.
Ao contrário do bizarro “glam-poser” que viceja por aí, o transexualismo e a androginia que mencionei aí em cima são o ponto de partida artístico e existencial para as canções do Antony & The Johnsons. As referências de Antony são os filmes underground de Jack Smith nos anos sessenta, as operetas-pop de Klaus Nomi - este, também herói de Morrissey - nos anos setenta e, mais recentemente, Boy George.
E seguindo por esta linha, Antony nos brinda com um maravilhoso trabalho ao piano acompanhado pela banda, compondo musicas devastadoramente lindas. A música de Antony é perturbadora e comovente. Tanto que Lou Reed chorou da primeira vez que o viu cantar, tornando se assim um protegido do casal Reed + Laurie Anderson, cantando em dois discos do ex-Velvet Underground. Em troca, Lou tem uma participação em seu disco “I Am a Bird Now”, tocando guitarra e declamando os versos "I was lying in my bed last night staring / At a ceiling full of stars / When it suddenly hit me / I just have to let you know how I feel". E aí entra a voz de Antony - encharcada de soul, blues e melancolia - cantando: "We live together in a photograph of time/ I look into your eyes/ And the seas open up to me". Eu sei que há pessoas com nervos de aço, sem sangue nas veias e sem coração, mas até pra eles é difícil não engasgar nessa hora...
Em 1988, depois de vários anos cantando em cabarés, principalmente os de orientação GLS, Antony & The Jonhsons chegou ao primeiro disco homônimo, só editado oficialmente dois anos depois. Lançado por um pequeno selo londrino (Durtro, do músico experimental David Tibet), o disco contribuiu para formar um pequeno, mas ativo, grupo de fervorosos fãs. O sujeito é um fenômeno: ele manipula sua imagem de modo indefinível, canta com voz em vibrato melancólico e uma performance de palco no mínimo bizarra e arrebatadora. Seu trabalho de certa forma é dolorido, mas cheio de esperança. Há algo de quase espiritual nele, um traço semelhante à fé.
É uma música sofisticada, com músicos bem treinados e transbordando um verdadeiro rio de sentimentos diretamente para a alma. E sua voz tem alguma coisa que atinge o sistema nervoso, apoiado por um instrumental que nos remete aos cabarés antigos, quase todo à base de pianos, violoncelos, baixos e orquestra.
Poucas vezes ouvi uma voz tão encantadora como a de Antony. Se de um lado é forte e rouca, de outro jeito é sutil e sensível.
Nestes tempos de “hits” instantâneos, Antony & The Johnsons resgata o verdadeiro sentido estético e existencial da arte, da música, da canção e do cantar.
O que Antony produz, é mais do que apenas outro trabalho qualquer da indústria da música, é um verdadeiro sopro de criatividade,nos brindando com álbuns riquíssimos, onde cada canção é uma página do diário de Antony, é um livro aberto dos seus sentimentos, das suas dúvidas, das suas tristezas, sendo que Antony canta tudo isto com uma voz cheia de alma, que se divide entre a duma mulher e dum homem, é algo que existe entre os dois sexos e que não está ao meu alcance de descobrir o que é.
Digo-lhes que, definitivamente este é um dos melhores cantores / compositores que já escutei, e aguardo ansiosamente por alguém que o supere.
Gênio!
Link: Cripple and the Starfish (Live)
Antony & The Johnsons - Antony & The Johnsons
Um comentário:
ótimo post!
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