
Nas ultimas semanas tenho estado bastante envolvido na questão da percepção das múltiplas nuances do que conhecemos por “realidade”. Invariavelmente, quando inicia-se uma pesquisa nestes termos, você encontra algumas frentes de abordagem diferente para a mesma: Drogas, Música, Artes, Religião, Psicologia, Antropologia, Sociologia, Esoterismo e Ocultismo, Sociedades Indígenas e Contracultura. Seleciona-se alguns dos tópicos de interesse, forma-se a linha de pesquisa e raciocínio e vai-se mais a fundo destrinchando.
Pois bem, a minha ótica foi a questão das drogas, música, sociologia, psicologia e contracultura, pois as drogas hoje em dia, apresentam-se em um contexto completamente diferente daquele que inicialmente, nos anos sessenta, se apresentava.
Imagine a cena: O pai, aos seus sessenta e poucos anos e a filha, após uma aula especial contra o uso de drogas. Ela chega em casa e diz ao seu pai: “Pai, ele falou um monte contra a maconha. E não é verdade! Eu não vejo acontecer, com você e a mamãe, nada do que ele falou que acontece quando se fuma um baseado!”. O velho hippie sorri. Este momento apresenta dois momentos da mesma história: o presente, manifestado pelo comentário da filha, e o sorriso do pai, que funciona como enigma, exigindo a reflexão sobre o passado.
O pai é personagem de uma época em que o uso de drogas, especialmente as alucinógenas, era visto como uma estratégia para abrir as portas da percepção. Para isso, basta lembrarmos da metáfora que Aldous Huxley utilizou para se referir à alteração dos estados de consciência produzidos pela ingestão de certas ervas e plantas, cujo este texto tem por título - bem como grande obra literária do autor. A filha, ao contrário do pai, vive num ambiente em que a droga é caso de polícia. Para o pai, em sua juventude, ser hippie era compartilhar um ideário cuja prática radical dava prioridade às experiências: viver em comunidade, encontrar alternativas para as relações opressivas e alienantes da sociedade de consumo e, é claro, viver de forma dionisíaca do cotidiano; ou intensamente o “aqui e o agora”.

A resposta parece simples. Parece.
As drogas, claro, não perderam suas propriedades. Alem do mais, a busca por estados alterados de consciência é algo que acompanha a história do homem provavelmente desde os seus primórdios.
Se essa busca liberta o homem ou, ao menos, contribui para tal, depende do que se entende por liberação. Depois, o homem enquanto sociedade dominante, encontrou novos significados para sua compreensão do mundo e, dentre estes, a imposição necessária de limites ao uso de drogas, oriundos de sua consciência.


Nessa época, tudo convergia para a formação de um universo psicodélico que a indústria cultural tratava de mercadejar. Drogas, sexo, experiências comunitárias, religiões exóticas e filosofias orientais pontilhavam o universo de interesse desse segmento novo de mercado: o jovem.
Hábitos, comportamentos e valores tradicionais são contestados, desmontados e modificados.
Mas, por que, nos anos sessenta, a experiência com drogas alucinógenas ganhou tanta importância? Desde a descoberta laboratorial do ácido lisérgico nos anos 40, ele despertou a curiosidade de cientistas e pesquisadores das mais diferentes áreas.
A possibilidade de usá-lo como arma estratégica também foi considerada, e a CIA posteriormente, patrocinou uma série de pesquisas sobre seu uso. Essas experiências não eram de todo desconhecidas. Muitos faziam dela uma forma de aumentar sua receita e outros, de ter novas experiências.
O culto às drogas ganha nesse momento um entorno mágico, terapêutico ou religioso. Não que ele já não existisse. O homem sempre experimentou produtos que afetam sua percepção, e, desde o começo dos tempos, comunidades inteiras usam bebidas e ervas alucinógenas como parte de rituais religiosos.
Historicamente, este momento foi um cenário bastante rico e de muitas transformações. Progressos tecnológicos melhoram a qualidade de vida, a taxa de mortalidade se reduz, e o tempo de vida da população aumenta. Num contexto de abundância material e com dinheiro na mão, essa geração sessentista, também conhecido como os “baby boomers” traduziu-se em poderosa demanda por bens de consumo, constituindo-se num fenômeno mercadológico por excelência. No entanto, consumistas ao extremo, também se entediavam facilmente.

A experiência com as drogas alucinógenas só se torna importante para o sistema simbólico dessa geração porque os efeitos produzidos pela experiência ganham nova significação, nova leitura. Experimentar drogas estava associado a um complexo mecanismo de busca pelo auto-conhecimento, pela expansão da consciência.
Sob o efeito de drogas alucinógenas, são poucos os que resistem à percepção de níveis diferenciados de realidade. É como se toda a estruturação lógica de nosso ego se desmoronasse. O inconciliável se concilia, os opostos se complementam. Mente e coração são percebidos enquanto unidade, e o racional é uma parte do vastíssimo campo de estruturações que a mente pode produzir. Os limites entre ilusão e realidade tornam-se tênues e a loucura se vislumbra no horizonte. Sonhar também é perigoso.

Mas, se por um lado, a experiência com as drogas alucinógenas permite alterações da consciência suficientes para que se percebam os limites da racionalidade, por outro; a reiteração do seu uso faz com que os velhos paradigmas reconquistem o espaço perdido integrando os efeitos alucinógenos como parte de seu sistema mental.
- Se o objetivo é a libertação das amarras da racionalidade, o obstáculo natural é a própria mente.

É impossível generalizar, mas não são poucos os relatos autobiográficos que narram o processo de abandono do uso de drogas após experiências muito fortes, autoreveladoras. Cedo ou tarde, essas experiências levam a secundarizar a importância da droga: depois que você descobre o outro lado... “para quê?”, pergunta-se a si mesma uma jovem, ex-freqüentadora do Santo Daime.
Em sua maioria, o percurso é recorrente: quando o uso de drogas desperta o universo religioso, místico ou mítico, a droga, de uma forma ou de outra, perde importância e significado.
A mesma jovem do início deste texto está agora falando com o pai sobre um livro. Entusiasmada, resume os argumentos que explicam a inexistência de loucura em determinadas sociedades não-civilizadas.
- “Nós tendemos à loucura, pai, porque tentamos explicar tudo. Não existe o desconhecido. Na pior das hipóteses, o psicanalista resolve. E a loucura, como uma panela, submetida à excessiva pressão, explode. Já para o não-civilizado, o diálogo se dá pela linguagem do mito, equilibrando o indivíduo às suas condições ambientais. Em última análise, o que o autor está dizendo é que a magia cura.”
- “E, por que, então, pai, não se usa mais a magia para se ficar menos louco?”
Um comentário:
amigo ja ouviu falar de experiencias feitas em tanques de privação sensorial?
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