terça-feira, 21 de julho de 2009

Maestros, Obras-Primas & Loucura, Andre Navarra e mais vinho...



Após a cretiníssima experiência nas mãos de um grupo de auto denominados “headhunters” ontem, resolvi largar mão hoje e exercer a minha função de vagabundo sênior.


Mas, convenhamos, o bacana é ser um vagabundo com classe, não um qualquer.


Então, lá pelas 9:00 da matina eu tive a cara de pau de abrir um vinho Chileno. Com as mãos passeando pela estante, resolvi dar mais uma chance ao livro “Maestros, Obras-Primas & Loucura - A Vida Secreta e a Morte Vergonhosa da Indústria da Música Clássica”, de Norman Lebrecht. Comprei-o ano passado enquanto dando minhas voltas sem rumo definido, que invariavelmente me jogam dentro das livrarias de São Paulo; mas confesso a vocês que após duas ou três tentativas, não deu a química e na época, deixei de lado. Agora finalmente venci a introdução e o primeiro capitulo, e estou com uma impressão bem melhor então acho que agora vai.



Lebrecht mostra como um grupo de engenheiros, empresários e regentes popularizou

um gênero musical até então restrito a círculos privilegiados, ao mesmo tempo em que gerou uma montanha de bobagens, excessos e egocentrismos.

Ele mostra também o vergonhoso declínio dessa indústria e, sempre disposto a polemizar através da ironia, faz uma seleção crítica das cem gravações clássicas mais importantes da história, e das vinte mais lamentáveis. Através de uma rápida folheada pelo livro, me deparei com pontos de vistas, casos e análises que acredito irão acrescentar e muito, para aqueles que querem entender um pouco melhor a música hoje em dia. Muito bom.



Como mesmo os vagabundos precisam almoçar e vinho em excesso quando em jejum não é lá a coisa mais recomendável do mundo, lá pelas tantas deixo o livro de lado e vou cuidar do nosso alimento de cada dia; afinal já tinha programado a tarde para ficar debruçado nos métodos, partituras e pesquisas, tendo por companhia a outra metade da garrafa. Como adoro isso... Crise? Ora, aproveite para viverem um pouco mais meus caros... (Outra coisa para NÃO ser citado em ocasiões como a do post anterior, enfim.)


Pesquisando a respeito de mais técnicas de arco já que a minha basicamente é experimental demais - ou, praticamente inexistente, como queiram - voltei meus olhos para o Cellista Francês e professor, André-Nicolas Navarra. Tudo a ver com o início do texto, este cara esteve presente por grande parte do período que o livro abrange, apenas constatando.


Nascido em 1911, desde pequeno ele foi preparado para ingressar no mundo da música – seu pai, de acordo com relatos era um excelente contra-baixista – e antes de iniciar os estudos efetivamente em algum instrumento, aprendeu a respeito de escalas, métrica harmonia e solfejos. Aos 7 anos de idade iniciou os estudos no Cello, e 2 anos depois foi aceito no Conservatório de Toulouse. Se graduou quando tinha 13 anos com honra ao mérito, ingressando logo na seqüência, no conservatório de Paris; aonde graduou-se novamente com honra ao mérito, aos 15 anos de idade.


Após o Conservatório de Paris, Navarra parou completamente com as aulas e não buscou mais aprimorar sua técnica – algo bastante incomum entre os Cellistas Solo. Ao invés disso, ele iniciou um trabalho pessoal para o desenvolvimento de um curso e métodos próprios, tornando-se assim por um período, autodidata no instrumento. Este trabalho incluiu a transcrição de enumeras técnicas de violino para o Cello, incluindo materiais de Carl Flesch e Otakar Ševčík. Tendo permanecido em Paris durante este período, ele teve a oportunidade pela observar musicistas como o Cellista Emanuel Feuermann, o pianista Alfred Cortot e o violinista Jacques Thibaud, além de se aproximar de alguns compositores de renome na época, como Ibert, Honegger e Florent Schmitt. Tempos depois, foi adotado como pupilo por certo período, por Pablo Casals.


Em 1929, aos 18 anos, Navarra ingressou ao Krettly Quartet, e permaneceu nesta parceria com eles por 7 anos, e em 1931 faz seu “debut” executando o concerto para Cello em D menor de Lalo, junto a Paris Colonne Orchestra. Em 1933, se torna o Spalla da Paris Opéra Orchestra, paralelamente ás suas colaborações como solista em inúmeras outras orquestras Européias.


Outra coisa inusitada quanto a este senhor, era o fato de Navarra praticar natação e ter uma queda acentuada por boxe, praticando-o por anos a fio. Dizia que isto era ideal para um Cellista e tais atividades, ajudavam em seu domínio do instrumento. Aos poucos, ele consolidava sua carreira como músico profissional, ganhando um empurrão extra em 1937, ao ganhar o primeiro prêmio e honrarias da Competição Internacional de Vienna.


No entanto, sua carreira foi abruptamente interrompida em 1939, quando estourou a 2ª Guerra Mundial, período este em que abandonou seu Cello e ingressou na Infantaria Francesa.


Após a Guerra, ele retoma sua carreira de musicista, e aceita o cargo de professor no Conservatório de Paris, substituindo Fournier; paralelamente as grandes turnês nos EUA, Europa, Ásia e na União Soviética.

Sob a condução de Barbirolli, gravou uma bem sucedida versão do concerto para Cello Solo de Elgar, o mesmo concerto que deu fama á saudosa Jacqueline Du Pré.


No entanto, Navarra tem o grande mérito como um dos melhores professores de Cello daquele período pela transcrição de várias técnicas do violino para o Cello. Paralelamente as aulas que ministrava no Conservatório de Paris, era freqüentemente chamado para dar aulas em outros institutos, como a Accademia Musicale Chigiana, em Siena, na Hochschule für Musik, em Detmold, em Saint-Jean-de-Luz bem como em Londres e Vienna.


Veio a falecer na, na Itália, em 1988.


Dentre seus trabalhos de cunho mais acadêmico, talvez ele tenha sido um dos precursores das vídeos-aula, tendo desenvolvido um material muito um material bastante bom em que explica suas técnicas de arco. Bom... Quanto a isso...

...vou explicar, para quê? Vejam o vídeo com sua execução de Moses Fantasy, de Paganini... Os links para as vídeo-aulas estão logo na seqüência...Em Alemão e Francês... Por ora, após uma pausa, acendo um cigarro e entorno o resto da garrafa em uma taça antes de retornar ao meu Cello... Divirtam-se!!



André Navarra - Paganini Moses Fantasy



















Andre Navarra Vídeo Links:


Andre Navarra explains his bow technique - part 01
Andre Navarra explains his bow technique - part 02
Andre Navarra explains his bow technique - part 03
Andre Navarra explains his bow technique - part 04
Andre Navarra - The left hand
Andre Navarra - Shifting


4 comentários:

Cecil disse...

Quanto ao lance de ser vagabundo com classe... nada mais glorioso... afinal, não era o Charlie the Tramp de Chaplin um vagabundo com postura, atitude e delicadeza de um príncipe? Ele é um aristocrata que sabe curtir a vida só que é maltrapilho. :)

Lembrei-me da famosa sequência em "Breakfast at Tiffany's" em que o escritor-e-vagabundo-e-galã (só que este era sustentado por uma mulher rica...:D) Paul diz a Holly (a divina Hepburn): nunca bebi champanhe antes do café da manhã. E depois: "-Isn't it wnderful? -What? -Tiffany's!" ;)

Vou ver os links depois... excelente postagem.

beijo

Marcelo Cz disse...

Quero de uma certa maneira,desabafar mesmo...Otimo o teu blog,um consolo a um solitario beberrão e esfumaçado leitor...Os posts sobre jazz estão sensacionais mesmo...Aliás,uma garrafa de vinho,um jazz e uma carteira de camel e uma leitura agradavel,pra que mais? abraços.

Andreas disse...

Marcelo meu caro,

Chegue mais, puxe uma cadeira, sirva-se de vinho e acenda o teu cigarro... És muito bem vindo, sinta-se em casa!
...quanto aos incríveis posts sobre Jazz, todo o crédito vai para a nossa querida autora, Santa Cecília!!

Grande abraço!
Andreas

Fred disse...

Também sou violoncelista, faço aulas regulares (pelo menos duas vezes por ano) com um dos maiores alunos de Navarra que também é brasileiro. Seu nome é Márcio Carneiro (procure no youtube depois, tem um vídeo dele tocando a terceira suíte de Bach, repare na técnica de arco). Acho que Navarra revolucionou a técnica de arco do violoncelo, principalmente ao que se diz respeito à flexibilidade. Dizem que ele desenvolveu isso tudo depois de uma conversa de apenas meia-hora (?!) com Carl Flesch, no camarim depois de um concerto. Sua gravação do Elgar é estupenda, diria melhor que a de DuPre. Um abraço!