sexta-feira, 29 de maio de 2009

"Tocar violoncelo" - por Guilhermina Suggia; "Music and Letters" Abril de 1921


E, aproveitando o post anterior referente a magistral Cellista Portuguesa Guilhermina Suggia, disponibilizo aqui um texto escrito por ela para a revista “Music and Letters”, em Abril de 1921.

Acho bacana este texto, pois possui algumas considerações muito válidas a respeito do instrumento, sua sonoridade, a técnica e feeling necessários para uma execução e interpretação razoáveis.

Este material se encontra publicado no livro "GUILHERMINA SUGGIA ou o Violoncelo Luxuriante” de Fátima Pombo, infelizmente fora de catálogo.

Uma pena!

Em tempo, a formatação original bem como expressões em Português de Portugal, foram mantidas.

Tocar violoncelo ("Music and Letters" - Abril de 1921)

Desde que escrevi sobre o violoncelo para Music and Letters (vol I, nº 2) fui solicitada, de vários quadrantes, a falar mais a seu respeito e especificamente sobre a sua sonoridade.


Uma grande técnica no violoncelo sem uma boa sonoridade não é agradável. Uma boa sonoridade não depende somente do fabricante do instrumento e é um facto que quanto melhor o instrumento, mais este parece exigir um bom executante. Muitos amadores têm a sorte de possuir os melhores instrumentos e, no entanto, ao passarem o arco pelas cordas poder-se-ia pensar que estavam a tocar naquilo que se pode chamar um instrumento feito em série. Suponho que se deve verificar isto em muitas coisas – quanto melhor o objecto, mais cuidado deve ser o seu tratamento. Vista-se um belo vestido a uma campónea sem jeito e tanto a rapariga como o vestido parecerão grotescos, enquanto que a mesma rapariga vestida com uma simples roupa de campo pode parecer até bastante atraente.

O mundo é unânime em afirmar que o violoncelo é o mais glorioso instrumento que os deuses jamais criaram; no entanto bem poucos são os violoncelistas que contribuíram para a sua glória.


Devemos muito de bom a muitos dos violoncelistas da geração passada, mas também lhes devemos muito de mau. Nos últimos 15 anos tem-se verificado um tal avanço na escola de violoncelo que creio que, se fosse possível ouvir tocar esses grandes virtuosos da geração passada ficaríamos surpreendidos por verificar que não nos agradariam tanto quanto os nossos antepassados. O violoncelo era, então, ainda jovem e estava apenas num estado transitório. Ainda me lembro que na minha juventude era impossível a um violoncelista auferir o mesmo pagamento que um violinista ou pianista, e que em algumas grandes cidades da Alemanha o violoncelo como instrumento a solo não era de todo apreciado; e lembro-me também que foi permitido a uma determinada violoncelista tocar em Munique apenas devido aos seus dotes físicos. Também se pode inferir que o violoncelo não era um instrumento solista pelo seu reportório. No meu artigo de Abril passado, pretendi mostrar como há muito poucas peças realmente de qualidade que tenham sido compostas para este instrumento a solo. Creio que isto se deve ao facto de, no passado, os compositores recearem compor para violoncelo, por este não ter sido concebido para interpretar verdadeira música. Existem há muitos anos algumas peças de grande valor, mas estas não devem ter recebido interpretações que lhes fizessem justiça, pois têm sucessivamente caído no esquecimento. O estudo do violoncelo – não há dúvida quanto a isso . tem sido abordado de forma incorrecta e estamos ainda hoje a sofrer as consequências. Provavelmente desenvolveu-se a técnica em detrimento da sonoridade, ou vice-versa; e se houve quem combinasse boa técnica com boa sonoridade, faltava-lhe a musicalidade. Ainda existem, perante o público, duas classes de executantes imperfeitos. O virtuoso sem musicalidade e o bom músico sem técnica. Pessoalmente, acho este último o menos nocivo dos dois; porque um tal instrumento pode, pelo menos, escolher peças que estejam de acordo com as suas limitações técnicas, enquanto que o mero virtuoso tentará tocar todas as grandes peças sem nenhuma reverência pelas ideias musicais do compositor, destruindo, assim, a essência dessas obras.


Chegou o dia em que as pessoas tomaram consciência de que o estudo da técnica e da sonoridade são indissociáveis no estudo da música. Tudo deve ser preparado visando o ideal de poder interpretar um trabalho dando-lhe o seu verdadeiro significado e não destacando a sonoridade, a técnica ou o vibrato.


O estudo do vibrato é um elemento muito importante na arte de interpretar. Gostaria de dizer algo sobre as diferentes utilizações deste ramo particular da técnica. Tal como as melodias variam, tal como varia a velocidade dos movimentos, assim variam os meios que utilizamos para exprimir estas diferenças, e uma das formas mais subtis de dar a interpretação exacta à melodia não é somente o conhecimento de quando fazer vibrato, ou se este deve ser rápido ou lento, mas também a intuição da adequação do vibrato ao espírito da peça. Talvez me torne ,mais explícita citando obras que todo o violoncelista deve conhecer. Se considerarmos a abertura das Variações de Böllmann e tocarmos este tema tal como o sentimos, devemos utilizar um vibrato rápido e frequente. Consideremos agora o tema inicial da Sonata em Lá de Beethoven. Aqui praticamente não precisamos de nenhum vibrato. Estes dois casos são extremos e por isso fáceis de seguir; mas se considerarmos a abertura do Concerto em Lá Menor de Schumann, o vibrato torna-se mais largo e lento, porque deve exprimir uma melodia cheia de sentimento. Ora, se um violoncelista executar estes exemplos utilizando somente um tipo de vibrato logo se aperceberá que alguns soam mal, quase ridículos; curiosamente, tal como uma pintura em que um pormenor discordante estraga toda a composição, também as interpretações de uma peça musical, quando qualquer aspecto é tocado de uma forma ignorante, mesmo que se trate apenas de vibrato, toda a perspectiva da peça é afectada. O vibrato em si é talvez o aspecto mais insignificante de todos os meios de interpretação, mas o abuso de vibrato pode arruinar completamente qualquer execução.


É necessário, vital até, saber distinguir entre um bom e um mau vibrato. Não depende só da velocidade mas também da qualidade que, juntamente com a pressão de ar, dá colorido à sonoridade. Não basta agitar a mão e o cotovelo para cima e para baixo ou virar os dedos de lado para os pontos. Um movimento demasiado rápido irá produzir um vibrato que mais não é do que uma nota tremida. O bambolear lento da mão também é mau, cria um zumbido monótono e pesado e afecta a entoação, fazendo com que a nota soe com três quartos de tom.


O vibrato é quase impossível de explicar por palavras, e talvez o mais difícil de ensinar. É essencialmente uma questão de ouvido sensível, como a entoação, e se o aluno não tiver um ouvido sensível é improvável que venha a produzir um vibrato realmente bom, ou uma entoação certa; e é inútil desenvolver uma técnica sobre estas bases erradas. Uma das maneiras mais simples de curar os efeitos destas imperfeições técnicas é exercitar a mente a ouvir o que está a ser produzido. Ocorreu-me frequentemente deparar com muitas pessoas que tocam sem nunca terem aprendido a ouvir aquilo que estão a tocar. Tenho a certeza de que muitos alunos fazem aquilo que lhes é dito para fazerem e muitas vezes praticam conscienciosamente sem estarem a ouvir o resultado do seu trabalho; e praticar exaustivamente, sem a capacidade de se ouvir ou de auto-criticar, é injurioso. Há outros, ainda, que têm facilidade de tocar sem praticarem mas raramente há qualquer profundidade ou verdadeiro valor na sua execução; o produto final é sempre superficial e inacabado. Isto significa que não se dedicaram ao trabalho de investigação sobre o seu instrumento e que pouco reflectiram sobre ele, porque o que fazem surge sem esforço, naturalmente. É impossível que um tal executante venha a ser um professor útil, porque, para ensinar algo, temos de saber exactamente como se faz - só quem se tenha esforçado arduamente para ser um bom artista poderá vir a ser um bom professor. Não há forma fácil na criação de um grande artista. Tal só se pode alcançar com muita paciência, trabalho árduo e amor pelo instrumento através do qual o artista comunica com o mundo.


Para que uma execução seja verdadeiramente perfeita, nenhuma qualidade se deve destacar, antes devem todos os pormenores técnicos surgir naturalmente – na exacta proporção requerida para a apresentação da peça. Só desta maneira poderá o executante aspirar a atingir aquele ponto de concentração que equilibra todos os elementos técnicos e de interpretação musical, para que a beleza da obra se destaque com primazia numa execução.


Pode dizer-se que o violoncelo é o instrumento mais difícil de se acompanhar. Há de facto poucas pessoas capazes de acompanhar cantores e instrumentistas. Em regra, o que acompanha bem os cantores acompanha mal os instrumentistas indiferentemente. A tarefa do acompanhador não é fácil. É verdade que este tem menos responsabilidade em público e não precisa de sofrer as terríveis agonias que os solistas sofrem. Para começar, tem que sintonizar a sua personalidade e individualidade com a do solista, a sua natureza tem que se fundir facilmente com a do outro, deve haver da sua parte empatia, altruísmo e subserviência sem auto-anulação. É essencial que quem acompanha seja capaz de interpretar a obra da mesma maneira que o solista e a sua grandeza evidencia-se na sua capacidade de prever o que o solista irá fazer e não só seguir a parte do solo, mas também apoiá-lo ao mesmo tempo. Como executante ele deve ter a técnica do solista, talvez com menos apuramento, e também o conhecimento da qualidade de sonoridade exigida, tanto ao tocar os “tutti” como quando acompanha o solista.


O cantor precisa de mais apoio de quem o acompanha e, devido à letra e à respiração, é mais fácil o pianista acompanhá-lo. Também há uma necessidade de usar o pedal para suster os acordes e harmonizações que ajudem o cantor; enquanto que, com um instrumento de cordas, especialmente com o violoncelo, o pedal deve ser usado cuidadosamente e é o pedal de surdina que é o mais usado.


A posição do acompanhador no mundo da música é tão importante como o de solista ou do executante da música de câmara; ele tem nas suas mãos o poder de fazer com que um concerto seja um sucesso ou um fracasso e, apesar do seu lugar na lista dos artistas ser sempre muito humilde, o que é exigido é na verdade muito.


Frequentemente os pianistas tornam-se acompanhantes porque falharam como solistas; outros acompanham enquanto aguardam uma oportunidade de se tornarem solistas; e poucos acompanham por acharem que é esse o seu métier. Em França há um maior número de bons músicos de acompanhamento do que em Inglaterra porque, assim que aprendem a técnica do piano, têm aulas dadas por solistas, tanto músicos de instrumentos de corda como cantores, e é natural que os acompanhantes tirem ainda mais proveito dos solistas do que dos seus próprios professores de piano. É interessante verificar, neste ponto, que os melhores acompanhantes para os instrumentos de cordas são quase sempre os próprios instrumentistas de cordas. Parecem saber intuitivamente qual a força de sonoridade necessária em cada momento, assim como parecem ter a capacidade de se movimentar em sintonia com o solista.


A arte de acompanhar deveria ser estudada tão cuidadosamente como qualquer outro aspecto de música, visto que o acompanhante é in
dispensável ao solista e que a sua contribuição na execução da obra é tão vital como a da pessoa que ele está a acompanhar para que o produto final seja uma obra completa. Artisticamente, o acompanhador pode ser um artista tão válido quanto os melhores solistas do mundo; a única diferença que existe na sua posição material é na verdade infeliz – é uma diferença comercial.


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quinta-feira, 28 de maio de 2009

Primórdios das mulheres no Cello - Guilhermina Suggia

Adaptado do texto de Fátima Pombo, Instituto Camões

Muito se comenta da nossa saudosa Jacqueline du Pré como ícone representativo das Cellistas contemporâneas.

No entanto, pouco se fala das primeiras gerações de Cellistas mulheres; as que abriram as portas para um mercado salvo raras exceções, essencialmente masculino.

Guilhermina Suggia foi uma excepcional Cellista Portuguesa, nascida em Porto, em 1885, foi a primeira mulher a fazer carreira a solo e a atingir tão grande êxito nessa profissão. De ascendência Italiana e Espanhola, desde muito cedo esteve envolvida com música. Iniciou seus estudos aos 5 anos de idade tendo seu pai como professor – Ele, Cellista no Real Teatro de São Carlos e professor no Conservatório de Música de Lisboa.


Claro, existiram outras mulheres anteriores a Suggia ou da sua geração que foram talentosíssimas musicistas e Cellistas, mas não atingiram o êxito desta primeira. Lisa Cristiani (1827-1853), parisiense, foi uma das primeiras Cellistas de que se tem conhecimento. No entanto, apesar do reconhecido talento de Lisa, diz-se que tinha um som pouco expressivo.


Gabrielle Plateau (1855-1875), belga, de quem se sabe muito pouco, é considerada possuidora de uma técnica brilhante, mas também sem um som poderoso.


De Beatrice Eveline (nasceu em 1877, desconhece-se a data da sua morte), inglesa, sabe-se que fez tours na Europa como solista. É, no entanto, May Mukle (1880-1963) que é considerada a pioneira das mulheres Cellistas, na Inglaterra e a primeira a conquistar o status de concertista. Beatrice Harrison (1892-1965), filha de ingleses, nasce no Noroeste da Índia. Fez o seu début com 15 anos, e foi a primeira mulher a tocar no Carnegie Hall e a primeira a ser convidada como solista pelas Orquestras Sinfônicas de Boston e de Chicago.


Na geração seguinte a Guilhermina Suggia destaca-se Thelma Reiss (Plymouth, Inglaterra,1906) e Raya Garbousova (Tiflis, Rússia, 1909). Ambas tiveram aulas com Suggia.


Cellistas como Antonia Butler (Londres, 1909) ou Florence Hooton (Scarborough, 1912) têm de ser consideradas fundamentalmente, como professoras.


Zara Nelsova (Winnipeg, Canadá, 1918) marca o início de uma geração de mulheres violoncelistas que já não estudaram diretamente com Suggia, mas que continuam a reconhecê-la como referência ímpar. Nelsova toca em 1950, no primeiro concerto que se realiza em memória de Guilhermina Suggia, com a Orquestra Sinfônica de Londres, dirigida por Sir Malcolm Sargent, na Royal Academy of Music.


E, como mencionado no início deste post, talvez a mais conhecida Cellista feminina, dotada de uma capacidade interpretativa belíssima que também é ligada ao nome de Suggia, é a brilhante Jacqueline Du Pré (1945 -1987) que ganha, com 10 anos, o Prémio Suggia, o qual lhe permite estudar com William Pleeth na Guildhall School of Music.


Guilhermina Suggia era uma mulher muito culta. Uma mulher de muitas experiências, uma conquistadora nata, tinha uma lógica própria e relacionava-se com o mundo a partir dessa lógica. Falar do seu temperamento implica falar de música, porque a vida de Suggia é acompanhada sempre de música e do Cello. Apesar do seu talento, estudava muitíssimo, motivada por um ideal de perfeição estilística e musical. Para Suggia, o Cello é o mais extraordinário de todos os instrumentos, considerando-o como o único que tem a capacidade de sustentar um baixo por um longo período e a possibilidade de cantar uma melodia praticamente em qualquer registro.

Porém, para que se revele a substância musical do Cello, é preciso que a técnica não seja estudada apenas como destreza, mas que tenda sempre para a música. “A técnica é necessária como veículo de expressão e quanto mais perfeita a técnica, mais livre fica a mente para interpretar as idéias que animaram o compositor”. [Guilhermina Suggia, “The Violoncello” in Music and Letters, nº 2, vol. I, Londres, Abril de 1920, 106].


Suggia dedica uma atenção muito sutil aos pormenores. Em Londres, quando mora num segundo andar, tem uma vizinha que se queixa que, num dos apartamentos do andar de cima, além de dar aulas de violoncelo, toca continuamente. Acrescenta ainda, com humor amargo, que Suggia se mudou para lá no Outono de 1922 e que até então, 1924, não deixou de tocar. Suggia fixa-se em Londres a partir de 1914 e só regressa definitivamente a Portugal nos anos 30.


A formação de Suggia, depois do que aprendeu com o pai e da experiência no Quarteto Moreira de Sá, é aperfeiçoada na escola alemã de violoncelo, que nos finais do século XIX e início do XX é a mais conceituada. Suggia parte para Leipzig em 1901 com uma bolsa de estudo concedida pela Rainha D. Amélia para estudar no Conservatório de Leipzig – conhecido pela exigência de ensino e pela exigência na seleção de alunos – com o professor Julius Klengel (1859-1933).


Sobre a sua discípula, informa Klengel num certificado, datado de 19 de Junho de 1902, que “sem dúvida não tem havido uma violoncelista com o mérito da artista de que me ocupo, que também não tem nada a recear no confronto com os seus colegas do sexo masculino. Mlle. Suggia, possuindo alta inteligência musical e um completo conhecimento da técnica, tem o direito de ser considerada, no mundo artístico, como uma celebridade”.


Klengel profetiza que Guilhermina “cheia de talento, conhecedora de todos os segredos do violoncelo, começa a subir e há-de ir tão alto que ninguém a atingirá”.


A profecia de Klengel realizou-se logo a seguir ao período de Leipzig, com Suggia a tocar com o maior sucesso nas mais prestigiadas salas de concerto Européias. Suggia, que sempre elogiou o professor Klengel e os seus extraordinários ensinamentos, destaca também a influência de Pablo Casals (1876-1973).


Em 1906 Suggia está em Paris, toca nessa altura para Casals e ainda durante esse ano começa a partilhar com ele a mesma casa, a Villa Molitor. O primeiro encontro com Pablo Casals foi no Verão de 1898, em Espinho. Casals tinha sido contratado pelo Casino de Espinho para tocar durante o estio, nas noites do Casino. Eram sete músicos, mas uma vez por semana Pablo Casals tocava a solo e dele se dizia que “transformava um café numa sala de concertos e esta num templo”. O pai de Guilhermina, atraído pela fama do violoncelista, pede-lhe para ouvir a filha (com 13 anos) e Casals, entusiasmado com o som dela, aceita dar-lhe aulas. Guilhermina passa o verão viajando em lentos comboios, entre o Porto e Espinho, carregando seu Cello, enquanto Casals ali trabalha.


Encontram-se outra vez em Leipzig, durante as visitas do catalão ao professor Julius Klengel.


Com Suggia e Casals vivendo juntos em Paris na Villa Molitor, está formado o casal mais famoso e talentoso de Cellistas. A casa situava-se na zona de Auteuil e estava alugada a Casals desde Janeiro de 1905. A Villa Molitor faz parte de um bairro de 25 casas. Casals alugou o nº 20 por ter um pequeno jardim e ficar no fim da rua. A casa tem três pequenos andares: a cozinha no térreo, a sala de jantar e a sala de visitas no 1º andar, dois quartos e banheiro no andar de cima.


No fim da Primavera ou início do verão, quando acabava a temporada de concertos e os músicos regressavam das suas tours, encontravam-se todos na Villa Molitor e daí resultavam extraordinários récitas musicais. Lembrou Casals mais tarde que tocavam juntos “pelo puro amor de tocar, sem pensar em programas de concerto ou horários, em empresários, bilheteiras, audiências, críticos de música. Apenas nós e a música”. Desse círculo de amigos faziam parte, entre outros, os pintores Degas e Eugène Carrière, o filósofo Henri Bergson, o escritor Romain Rolland, os músicos Ysaÿe, Thibaud, Cortot, Bauer e compositores como d’Indy, Enesco, Ravel, Schönberg, Saint-Saëns.


Durante o período Parisiense, encontra-se na revista Le Monde Musical muitas referências entusiasmadas às interpretações de ambos.


O ano de 1913 é devastador para a relação Suggia-Casals. O violoncelista pretende sepultar no mais profundo esquecimento aquele pedaço de vida a que ele se referiu como o “episódio mais cruelmente infeliz da minha vida”. Suggia, quando mais tarde se referir a Casals, será na qualidade de violoncelista e nunca no plano amoroso.


O quadro que Augustus John pintou de Guilhermina Suggia em 1923 traz para a tela, a têmpera de Suggia quando toca em público. Durante as sessões no atelier do pintor, Suggia tocava Bach. Essa imagem que o artista tão irresistivelmente captou é um legado para a posteridade sobre a atitude interpretativa de Suggia. No palco encarna a figura da prima-dona que domina a música.


Quando entra é uma aparição imponente e desde esse momento começa a magnetização do público ao unir a técnica e a compreensão absoluta da obra. É comum ler-se nas críticas que os aplausos são estrondosos, ressoando nas salas com assistências enfeitiçadas. Suggia, mais do que aplaudida, é aclamada.

Suggia provoca, em geral, sentimentos extremos porque ela própria é de uma impenetrabilidade de aço ou de uma generosidade sem par. Pode ser efusiva, rir alto, ser extravagante, mas também recolher-se até à nostalgia, ser silenciosa e austera.


No Porto, dizem que é uma Inglesa excêntrica, que gosta de usar palavras estrangeiras na conversação, afastando-se ostensivamente quando alguém espirra. Tem um sentido de humor Britânico que exercita nos circuitos sociais. Ao contrário das senhoras da cidade do Porto, Guilhermina Suggia joga tênis, pratica remo e natação. Muitas vezes é ela que conduz o seu Renault preto, dispensando o motorista. Em Leça da Palmeira, alugou uma casa para estudar. Leva um dos cães consigo, Mona ou Sandy e o violoncelo.


Durante a Guerra, Suggia permanece mais em Portugal, e no Porto solicitam a sua participação em concertos para angariar fundos humanitários. No final dos anos 40, o encontro de Suggia com Maria Adelaide de Freitas Gonçalves, diretora do Conservatório de Música do Porto, tem conseqüências para a vida musical da cidade: a formação da Orquestra Sinfônica do Conservatório, integrando alunos finalistas dessa escola, a que a diretora chamava carinhosamente o “viveiro”.


Suggia apoiou o naipe de violoncelos e foi solista no concerto de apresentação da Orquestra, na noite de 21 de Junho de 1948, no Teatro Rivoli. Tocou o Concerto de Saint-Saëns e Kol Nidrei de Max Bruch. Dos seus alunos – Pilar Torres, Madalena Moreira de Sá e Costa, Isabel Millet, Maria Beires, Maria Alice Ferreira, Celso de Carvalho, Filipe Loriente, Carlos de Figueiredo, Amaryllis Fleming, Audrey Rainier, Jean Marcel – tinha uma intuição muito lúcida quanto ao papel que desempenhariam na música enquanto Cellistas.


É preciso suportar os bastidores e saber que “para tocar queimamos os nossos nervos”, dizia aos seus discípulos, que nunca aceitou em grande número.


Em 1949, Suggia com sinais visíveis de doença, tem a corajosa iniciativa de criar o Trio do Porto, constituído por ela, pelo Violinista Henri Mouton e pelo violetista François Broos. É neste período dos anos 40 que Suggia reforça os laços musicais com compositores e intérpretes Portugueses, tocando no Porto, em Lisboa, Aveiro, Viana do Castelo, Braga, Viseu... muitas vezes a convite do Círculo de Cultura Musical dessas cidades. Em 31 de Maio de 1950 toca pela última vez em público, num recital no Teatro Aveirense, para os sócios do Círculo de Cultura Musical de Aveiro, acompanhada ao piano por Maria Adelaide de Freitas Gonçalves. Foi o seu último êxito. Regressa ao Porto conduzida pelo motorista, com o carro cheio de flores. A viagem à América, tão desejada e já programada, não se realizará.


Visando distinguir o melhor aluno do Curso Superior de Violoncelo do Conservatório de Música do Porto é instituído por vontade testamentária da violoncelista o Prêmio Guilhermina Suggia, atribuído pela primeira vez em 1953.


Igualmente em cumprimento de disposição testamentária é instituído a partir de 1951 o Prêmio Guilhermina Suggia a atribuir pela Royal Academy of Music de Londres com o principal objetivo de incentivar os violoncelistas com perfil de intérpretes a solo a dedicarem-se a um período especial de pós-graduação.


Guilhermina Suggia tinha vários violoncelos. Entre eles destacam-se os famosos Stradivarius (Cremona, 1717) e Montagnana (Cremona, supostamente em 1700; na etiqueta o terceiro algarismo não está completamente legível, embora se assemelhe a um zero). Suggia fez poucas gravações. Para além das gravações existentes em 78 rotações, está atualmente disponível no mercado o CD “Guilhermina Suggia plays Haydn, Bruch, Lalo,” .


Link:














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domingo, 17 de maio de 2009

...da série "Isso não pode estar acontecendo comigo"




Homenagem mais ou menos póstuma ao Cello de uma amiga...
Embora fosse um instrumento de estudo; não é coisa que se faça com um Cello... Putz... Foi para um luthier, veremos se tem jeito...


segunda-feira, 11 de maio de 2009

Violinos, Cello, Rock Pt.20 – Vanguard (Finland)




Embora eu considere meu gosto musical um pouco fora do convencional visto o tipo de material que costumo postar por aqui, de tempos em tempos eu sinto uma necessidade bastante grande de resgatar as minhas raízes musicais... Isto é, barulho; muuuito barulho! rs Sempre gostei e ainda mantenho meu pé ali calcado no bom e velho Heavy Metal, a brutalidade deste tipo de som tem o poder de lavar minha alma e dar aquela revigorada... : )


Vanguard é uma banda Finlandesa que acompanho desde sua primeira demo de 2004; primeiro pelo crossover entre o Black x Death Metal e segundo, pela improvável existência de um Cello no meio do pandemônio sonoro.


Em 2005, após participarem do festival Alemão “Wacken Open Air” – um dia estarei lá – eles finalmente tiveram a oportunidade de gravar seu primeiro full play, seu debut “Succumbra”. Considero este álbum um trabalho ainda bastante cru. Mas, apesar de não apresentarem nada de novo a não ser uma bela coleção de clichês funcionais e uma horripilante arte final, existia certa “aura” em sua música que indicava que ainda iriam mostrar a que vieram de fato.


Pois bem.

Eis que agora em 2009, lançam seu segundo full play de estúdio nomeado “Hydralchemy”. E nossa, que surpresa!! Neste Hydralchemy, finalmente o Vanguard começou a se refinar, criando uma coalizão quase perfeita entre força bruta e maciça e beleza sutil; apresentando composições que se assemelham a verdadeiras forças da natureza.


Este álbum mostra uma grande maturidade e coesão em suas composições. Todos os instrumentos se complementam perfeitamente, criando melodias perfeitas e poderosas. O destaque fica por conta dos vocais femininos da cantora Suvi Grym pois, diferentemente das inúmeras clones da Tarja Turunen (Ex- Nightwish), ela soa totalmente natural e não usa de influências de canto lírico.


E, fazendo juz à presença desta banda neste blog, como não poderia ser diferente; lá está presente o Cello em praticamente todas as músicas, adicionando “aquele” feeling as musicas bem como um maior senso de profundidade – embora este, não seja instrumento de destaque como, por exemplo, no caso do pessoal do Hevein.


No geral é um belíssimo trabalho, embora pouquíssimo indicado para quem não tem uma veia Black ou Heavy Metal... No entanto, para os amantes do gênero, é um prato cheio!


Lindo!


Link Clip: “Whisper”















Link: Vanguard - “Hydralchemy”.
















domingo, 10 de maio de 2009

Cello Concertos - António Jacinto Pascoal


Quero ver alguém encontrar isso aqui... hehehe


O escritor Português António Jacinto Pascoal nos brinda com um livro cuja idéia é uma feliz analogia entre metáforas de nossa existência em forma de poesia, e a música e o Cello, por isso; o título: “Cello Concerto”.


Publicado pela editora Novo Imbondeiro, em 2006; a base de seu trabalho está na idéia da precariedade do ser humano e da injustiça que impera em nossas vidas em suas formas mais gritantes.. Resgatando a memória da humanidade vinculada aos séculos XIX e XX, “Cello Concerto” trata-se de um discurso baseado nos pontos de vista dos pensamentos, isto é; usa e abusa das divagações puras e por vezes talvez até abstratas e obsessivas.


No entanto, o que gosto deste tipo de texto é o fato de que quem costuma se utilizar de divagações, não costuma sofrer de problemas como por exemplo a presunção ou até mesmo qualquer espécie de pretensão. Portanto, temos textos gostosos, abstratos, leves e o mais importante talvez; sinceros. Como bem disse o resenhista Português João Carvalho; Um livro contra a arbitrariedade da morte e com a morte, também ela vida, e pelo belo e o absoluto dessa obra de arte que é cada criatura humana.”


Muito Bom. Com sorte a Livraria Cultura arruma uma cópia...


Quanto ao Euro? 2,81 pela ultima vez que vi... : )

Em tempo? - Linda a capa...




Panorama Geral sobre Cello - Aspectos físicos, técnicos e históricos.

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Material bem bacana que apresenta um panorama geral sobre o Violoncelo escrito pela Violoncelista Raquel Almeida Lemos Rohr de Oliveira.


Não sei em qual contexto foi escrito tal material, penso ter sido na ocasião do 20º Congresso da Associação dos Músicos Batistas do Estado do Espírito Santo Linhares-ES. No entanto gostei pela simplicidade e objetividade. Aborda aspectos básicos sobre o Cello, desde a história, passando por compositores, partes do instrumentos, como manuseá-lo bem como algumas técnicas e terminologia própria ao instrumento.. Bem bacana; posto aqui pois ele também funciona como um resumo de vários pontos já abordados ao longo destes anos de blog. Bastante indicado para quem quer iniciar seus estudos no instrumento, bem como para outros já iniciados que desejam rever determinados conceitos.. Gostei!


A Cellista Raquel Almeida Lemos Rohr de Oliveira iniciou seus estudos no instrumento aos onze anos na Escola de Música do Espírito Santo sob a orientação do professor Sanny Souza. Cursa bacharelado em violoncelo na Universidade Fede­ral de Minas Gerais(UFMG) sob a orientação do professor Cláudio Urgél. Participou de diversos festivais como a Oficina de Música de Curitiba(2004), Ação Social pela Música- Mercosul (1996), Festival de Juiz de Fora(2005/2006), Semana da Música de Ouro Branco (2005)entre outros. É integrante da Orquestra Sinfônica da Escola de Música da UFMG. Em 2003, atuou como solista frente à Orquestra Filarmônica do Espírito Santo. Nesse mesmo ano obteve terceira colocação no concurso Furnas Geração Musical etapa Espírito Santo.


Muito bom!



Link: